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Florestas ganham mapa em 3D

Tecnologia que faz sucesso no cinema ajudará a rastrear desmatamento e queimadas

Moda no cinema, o 3D extrapolou as telonas e chegou à Amazônia. A tecnologia será testada no monitoramento da floresta a partir da semana que vem. À frente da experiência está a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que, com o novo modelo, desenvolvido dos EUA, espera conseguir informações inéditas sobre a composição da mata, suas redes de drenagem e a atividade humana na região.

A tecnologia tridimensional já é aplicada em florestas temperadas dos EUA e Canadá. Para chegar ao Brasil, o sistema sofreu adaptações que propiciassem a penetração das imagens em matas mais densas. Isso porque, ao contrário do monitoramento por satélite, usado atualmente na Amazônia, a resolução em 3D consegue atravessar a cobertura vegetal e enxergar qualquer objeto a até 15 centímetros do solo.

– Vamos usar um equipamento aerotransportado, com um pulsor de laser acoplado a um GPS – explica Marcus Vinicio Neves d’Oliveira, pesquisador do Laboratório Virtual da Embrapa nos EUA, onde o novo monitoramento foi desenvolvido. – Esta máquina atua com frequência de 100 mil a 200 mil pulsos por segundo. A cada pulso emitido, ela retorna com até oito informações de três coordenadas: latitude, longitude e altitude.

A precisão do escaneamento permite aos pesquisadores selecionar pontos e, no sistema, simular a região sem árvores. A técnica é útil para o planejamento de manejos de solo.

Outra atividade humana que pode ser extensivamente vigiada é o desmatamento, em boa parte ainda oculto pela copa de árvores maiores.

– Como é possível rastrear qualquer coisa a 15 centímetros do solo, conseguimos identificar o corte ilegal de árvores – revela d’Oliveira.

Além do que foi derrubado, o 3D mede a riqueza da vegetação resistente ao avanço humano. O levantamento tridimensional proporciona ainda o cálculo da biomassa da floresta. Ou seja, o volume de madeira de árvores e os estoques de carbono.

– São parâmetros avaliados separadamente em cada árvore, que podem ser úteis para traçar políticas públicas – ressalta o pesquisador.

A vocação multiuso do levantamento alcança até a paleontologia. A equipe responsável pelo 3D avalia se uma das prioridades do levantamento será detectar, sob a cobertura vegetal, a eventual existência de geoglifos ainda desconhecidos.

Os geoglifos são figuras desenhadas nas rochas por povos antigos, supostamente demarcando terras sagradas. No Brasil, algumas imagens já foram encontradas no Acre, justamente o estado eleito para os primeiros monitoramentos tridimensionais.

A tecnologia 3D foi a responsável pela descoberta da cidade maia de Caracol, no atual Belize.

Projeto pode chegar à Mata Atlântica

O levantamento 3D começa na segunda-feira. A fase aérea, feita com apoio do Serviço Florestal Americano (USDA), dura poucas horas. O trabalho de campo, no entanto, é mais longo – sua conclusão está marcada para o fim de julho. Três áreas foram escolhidas para o início do projeto, totalizando mil hectares.

– Por enquanto, o preço do rastreamento ainda é caro demais: custa 65 dólares por hectare – admite d’Oliveira. – Nos EUA, monitorar a mesma área exige apenas US$ 2. Mas a tendência é que o preço caia conforme a técnica se popularize por aqui e chegue a territórios maiores.

O USDA também vai atuar na análise dos arquivos gerados, etapa que será cumprida nos EUA até outubro. A Embrapa publicará um balanço sobre a atividade no fim do ano. O julgamento sobre o desempenho das ferramentas vai determinar se o 3D será adotado. A partir daí, seu uso pode ser expandido para o resto da Amazônia e outras regiões do país, inclusive a Mata Atlântica, cujo dia é celebrado hoje.

(Renato Grandelle)

(O Globo, 27/5)

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