Um dia após a votação do Código Florestal, representantes de instituições governamentais e da sociedade civil se reuniram nesta quarta-feira (25), em Curitiba (PR), para debater sobre iniciativas de conservação e recuperação de uma das áreas mais devastadas do País: a Mata Atlântica.
A ecorregião se destaca por ser uma das zonas com maior biodiversidade do mundo, mas é também o segundo ecossistema mais ameaçado do planeta (possui apenas 8% de sua cobertura vegetal original), perdendo apenas para as quase extintas florestas da Ilha de Madagascar, na África.
Durante a Semana da Mata Atlântica, os participantes vão discutir políticas públicas e intervenções emergenciais para a proteção da região, além das adequações necessárias em projetos em função das alterações no Código Florestal.
Presente ao evento, o diretor do Departamento de Florestas do MMA, João de Deus Medeiros, disse que a crise de ocupação estabelecida de maneira não estratégica e não sustentável na Mata Atlântica deve ser revertida a partir de agora, e que o texto substitutivo do Código aprovado pela Câmara dos Deputados pode propiciar novos desmates em áreas que, necessariamente, devem ser protegidas.
“No texto aprovado ontem foi estabelecida, por exemplo, a emenda 164, que suprimiu, dentre outros pontos, a proteção dos manguezais. Dela consta ainda um parágrafo que prevê que zonas de ocorrência de algumas espécies de peixes não podem ser áreas protegidas, o que pode provocar uma devastação muito grande por conta de uma exploração econômica predatória. A perspectiva para a região da Mata Atlântica é preocupante”, avaliou o diretor.
Medeiros explica que esta emenda pode ainda descaracterizar o conceito de área de preservação permanente (APPs) no ambiente rural. “Toda atividade agrossilvopastoril, por exemplo, já possibilitaria automaticamente a retirada de vegetação. Não seria o caso de se regularizar situações já consolidadas, mas de se permitir novos desmatamentos em APPs. Se a redação for mantida como está, o próprio poder público só poderá fazer a proteção de uma área de utilidade pública com a aprovação de uma lei específica”, afirmou.
Ele ressaltou a importância de se reforçar a proposta de associação de APPs e reserva legal em pequenas propriedades rurais (entre 20 e 400 hectares), e que tal iniciativa pode ser uma contribuição eficiente para a recuperação da Mata Atlântica.
O diretor lembrou também que o Brasil tem a maior extensão de florestas tropicais do planeta e que a biodiversidade da Mata Atlântica é avaliada como um patrimônio mundial. Citou ainda a importância dos planos municipais de recuperação dos recursos da Mata Atlântica e do manejo florestal sustentável.
“O desafio de preservação é imenso. A Lei da Mata Atlântica não impossibilita o uso dos recursos naturais da região, e a exploração econômica da mesma é possível, desde que não seja realizada nos poucos remanescentes que ainda existem. Mais que nunca, é hora de ações inovadoras na região, como o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), a gestão eficiente de unidades de conservação e e levantamentos e pesquisas de espécies existentes e das ameaçadas. O que aconteceu ontem no Congresso foi uma demonstração muito clara de que muitos políticos ainda não compreendem a relevância da proteção ambiental para o real desenvolvimento do País”, avaliou.
Preservação dos recursos naturais – A diretora de Conservação da Biodiversidade do MMA, Daniela Oliveira, destacou a relevância da conservação dos recursos naturais. Para se ter uma ideia, disse, ter mata ciliar nas beiras de rios é importante para se evitar enchentes, deslizamentos e assoreamentos. “Manter as encostas é necessário para que os morros não desabem sobre populações ocasionando perdas de vidas humanas. A conservação da biodiversidade está relacionada à manutenção da vida de cada um. Precisamos mostrar a todos que esta questão é de todos e de cada cidadão”, ressaltou. De acordo com o IBGE, cerca de 120 milhões de brasileiros vivem na região da Mata Atlântica.
O presidente do Conselho Nacional de Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, Cleiton Lino, defendeu que o Brasil deve ser uma referência mundial na Rio+20, e que é hora do “País dar exemplos”. Para ele, as alterações feitas no Código Florestal podem resultar no descumprimento de compromissos estabelecidos pelo Brasil nas convenções da Diversidade Biológica (CDB) e do Clima.
“Nas metas definidas na última convenção da CDB para 2020, o Brasil foi uma liderança e assumiu que iria recuperar grandes áreas dos ecossistemas terrestres e marinhos. Espero que possamos honrar estes compromissos e não passar um atestado de incoerência”, afirmou.
Já o coordenador da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), Renato Cunha, lembrou que a presidenta Dilma não pretende apoiar algumas questões consideradas delicadas nas negociações do Código, como a anistia aos desmatadores e a isenção de APPs e reserva legal em pequenas propriedades.
“Se o Brasil realmente aprovar o Código da maneira que está, será um retrocesso muito grande e uma incoerência, tendo em vista os acordos internacionais já firmados e o fato do País sediar uma conferência como a Rio+20?, disse Cunha.
Fonte: Carine Corrêa/ MMA