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A Regulamentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos está em vigor e não pode passar despercebida. Análise Parte I

(*) Cássio dos Santos Peixoto

Nos derradeiros dias de 2010, precisamente em 23 de dezembro, o Presidente da República decretou a regulamentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituída pela Lei nº 12.305/2010. O Decreto nº 7.404, como expresso em seu art. 86, entrou em vigor na data de sua publicação, portanto, regras com eficácia jurídica imediata. Assim, antes de fazer uma análise sobre os ditames regulamentares, vale observar que a legislação chegou ao apagar das luzes do ano e do governo, obrigando-nos a fazer algumas observações quanto a sua destinação e publicidade.

Está firmado o entendimento que a alegação do desconhecimento da lei é inescusável. O art. 3º da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro proclama: “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.” A vida em sociedade não seria possível se todos pudessem alegar o desconhecimento da lei para se furtar a cumpri-la. Daí a necessidade da ficção jurídica de que todos devem conhecer a lei. Na prática, contudo, tal princípio está longe da realidade, tendo em vista a proliferação legislativa, com edição diária de diversos diplomas legais, ficando cada vez mais difícil ao cidadão comum conhecer intimamente às leis.

A nossa crítica vem quanto ao aspecto temporal da publicação do decreto regulamentador que, não atingiu a publicidade real, principalmente por atingir os hábitos dos cidadãos, impondo-lhes mudanças de atitudes, inclusive prevendo diversas sanções. Pela lógica, uma regulamentação que pretenda alterar o comportamento da sociedade, não deveria vir em uma hora de atenção emocional diversa, direcionada à simbologia do período, o que dificulta sua internalização.

Independentemente da consideração esposada, que em nada diminui a importância da nova legislação, a crítica cinge-se em registrar que se as leis, em geral, passam despercebidas da população e, às vésperas do período de festas, torna tudo ainda mais complicado. Deste modo, as campanhas que já seriam necessárias, serão vitais daqui para frente.

Em resumo, a PNRS encontra-se devidamente regulamentada, carecendo apenas, de algumas resoluções, instruções e dos planos de resíduos sólidos. Asseverando que, significativas parcelas das dúvidas foram sanadas em seu texto.

Objetivamente, o Dec. nº 7.404/2010 traz 86 artigos que discorrem sobre as regras tratadas na PNRS (Lei nº 12.305/2010) e, como estudiosos do assunto, entendemos como sendo importante levantar os temas que merecem maior destaque, à medida que os mesmos se apresentam na nova regulamentação:

Começamos pela instituição do Comitê Interministerial da PNRS, formado por 12 representantes dos ministérios que poderão convidar, inclusive, representantes do setor privado. Além disso, o Comitê poderá propor medidas que visem a desoneração tributária para produtos recicláveis e reutilizáveis (note-se que, não se trata de reciclados e sim recicláveis), além da simplificação dos procedimentos de obrigações acessórias relativas à sua movimentação. Em sendo proposta tal medida, certamente será um ganho considerável para os empreendimentos que se destaquem no gerenciamento eficaz destes resíduos.

Outro ponto não menos relevante será a propositura de linhas de créditos em instituições financeiras federais.

Quanto aos consumidores finais, fica expressa a obrigação de adimplir as regras estabelecidas sobre coleta seletiva, com a segregação prévia dos resíduos conforme sua composição ou constituição, sempre da forma que dispuser os titulares do serviço público de limpeza urbana ou de manejo de resíduos. Também, fica obrigado o consumidor, a acondicionar corretamente os resíduos contemplados pelo sistema de logística reversa. Estas regras estão no capítulo das responsabilidades dos geradores de resíduos e do poder público.

Um dos temas mais debatidos, desde a criação da PNRS é a logística reversa que, restitui ao setor empresarial os resíduos vinculados a sua operação, para reaproveitamento, destinação ou disposição final adequada dos resíduos e embalagens. Entretanto, é vital que a sociedade e os cidadãos iniciem o processo reverso para que seja logrado êxito no sistema.

Complementar ao sistema de logística reversa estão os acordos setoriais como instrumento inicial, seguido dos regulamentos expedidos pelo Poder Público. Cabendo assim, sugestão aos empreendimentos para que optem pela primeira alternativa, antes que a regulamentação possa vir de forma não sustentável economicamente. Seguindo nesta trilha, ressalta-se que os Acordos Setoriais podem ter iniciativa tanto do Poder Público como do Setor Privado. Quando a iniciativa partir do Poder Público, deverá ser precedida de chamamento público, sendo relevante, uma postura aberta às negociações, além da afinação entre os membros setorizados. Lembrando que existe, ainda, a impossibilidade de abrandamento das medidas instituídas pela Lei nº 12.305/10 e pelo decreto regulamentador nº 7.404/2010.

O novo decreto reafirma a obrigação de criação e estruturação da logística reversa pelos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes para àqueles que estejam enquadrados nos incisos I a VI do art. 33 da Lei nº 12.305/2010. Vale dizer que, estes setores já se encontram em avançado desenvolvimento.

Os Acordos Setoriais não se encontram, ainda, tão avançados, em função das suas próprias características. As exigências são maiores e dependem de uma maior convergência de interesses. Além disso, existe uma gama de pontos e estudos a serem desenvolvidos, como também, uma lista de documentos que deverão acompanhar a formalização destes acordos setoriais, que, ainda, estarão sujeitos à consulta pública, com a formatação a ser definida pelo Comitê Orientador.

O termo de compromisso, que restou como terceiro instrumento, prevê o estabelecimento da logística reversa a ser firmada entre o Poder Público e o Setor Privado em função da não existência de acordo setorial em determinada área de abrangência ou, também, para fixação de metas mais exigentes do que o previsto no acordo setorial, neste caso, este documento acaba funcionando como um gravame consensual.

Para finalizar esta primeira análise dos artigos iniciais da recente regulamentação, o novo diploma cria o Comitê Orientador para implantação da logística reversa, composto por cinco ministérios, sendo presidido pelo Ministro do Meio Ambiente.

Discutir e apresentar análise jurídica desta regulamentação exigirá um trabalho denso que nos obriga a dividir este tema em partes, para que se possa explorá-lo melhor, esmiuçar a intenção da norma à sua materialização. Com certeza não iremos esgotar a análise nestes modestos artigos, mas o objetivo é discutir o assunto com atenção e responsabilidade jurídica que o tema merece.

(*) Cássio dos Santos Peixoto , Professor de Legislação e Direito Ambiental da Pós-Graduação em Gestão Ambiental da Faculdade SENAC MG. Advogado, Perito Ambiental, Pós-Graduado em Direito Tributário, Direito Empresarial, Direito Ambiental e em Gestão Ambiental. cpeixoto.bms@terra.com.br / cpeixoto@bmsempresarial.com.br

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